
Um estudo do Programa de Pós-Graduação em Ciências Ambientais da Universidade Federal de Alfenas (Unifal-MG) revelou como moradores de Caldas (MG) percebem os impactos ambientais, sociais e de saúde deixados pela antiga mineração de urânio no município. A pesquisa destacou sentimentos de medo do câncer, desconfiança em relação à qualidade da água e a existência de um silêncio social construído ao longo de décadas. Apesar da convivência cotidiana com rejeitos radioativos.
A investigação foi realizada por Vívian Ariane de Oliveira Costa, doutora pelo PPGCA, sob orientação da professora Luciana Botezelli e coorientação do professor Luiz Felipe Silva. Entre julho e novembro de 2023, 365 moradores com mais de 40 anos responderam questionários com perguntas abertas e fechadas. A amostra representou estatisticamente a população adulta de Caldas. E os dados foram analisados por métodos quali-quantitativos com o uso do software IRaMuTeQ.
Memórias de exploração
Segundo a pesquisadora, o estudo buscou compreender como a comunidade expressa suas experiências de vulnerabilidade e resistência em um território marcado por memórias de exploração mineral. “A pesquisa nasceu do desejo de ouvir as vozes da população. E compreender como se expressam as experiências de vulnerabilidade, resistência e esperança em um território que, mais do que palco de exploração mineral, é espaço de vida, memória e busca por justiça ambiental”, afirma Vívian.
As respostas apontaram um cenário de desinformação, medo e sensação de abandono institucional. Muitos moradores reconhecem os riscos ambientais, mas poucos conseguem relacioná-los aos impactos socioambientais históricos. A desconfiança quanto à qualidade da água e o temor de doenças, especialmente o câncer, foram temas recorrentes.
A mina de urânio de Caldas, operada pelas Indústrias Nucleares do Brasil (INB) entre 1982 e 1995, deixou uma série de passivos ambientais, como barragem de rejeitos radioativos, cava aberta e estruturas de beneficiamento desativadas. Atualmente, a mesma região desperta interesse pela presença de jazidas de terras raras — minerais estratégicos para tecnologias voltadas à transição energética.
Participação da comunidade
Para a pesquisadora, os resultados reforçam a necessidade de revisar políticas de fiscalização. E ampliar a comunicação de risco e garantir a participação efetiva das comunidades nas decisões sobre mineração e gestão ambiental. A professora Luciana Botezelli destaca que os achados revelam um déficit de informação ambiental e uma naturalização do risco. “Isso exige políticas públicas mais sensíveis às realidades locais, especialmente em regiões que voltam ao centro do debate nacional por causa das terras raras”, salienta.
O estudo recebeu segundo lugar entre os melhores trabalhos apresentados no 22º Congresso Nacional de Meio Ambiente (CNMA 2025), em Poços de Caldas, e integrará o e-book oficial do evento. Para Vívian, o reconhecimento fortalece a função social da universidade pública. “Representa o fortalecimento de uma extensão crítica e transformadora, que conecta pesquisa científica à defesa dos direitos humanos e ambientais.”
A equipe pretende ampliar a investigação, aprofundando o diálogo com movimentos locais e pesquisadores de outras áreas. Com foco em uma abordagem interdisciplinar que una ciência, política e cidadania ambiental.
(Fonte: Jornal da Unifal)







