
Perseguições, desaparecimentos, violações de direitos humanos e abandono forçado, em solo norte-americano, de bens, familiares, amigos e projetos de vida. Esses foram alguns dos relatos apresentados em audiência pública da Comissão do Trabalho, da Previdência e da Assistência Social da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), em Governador Valadares (Vale do Rio Doce), sexta-feira (19).
A reunião, solicitada pelo deputado Betão (PT), presidente da comissão, ocorreu na Câmara Municipal. Houve debates sobre os impactos da nova política anti-imigração do governo de Donald Trump. E ainda as condições de repatriação de trabalhadores mineiros deportados dos Estados Unidos.
Perdeu o nascimento do filho
O casal Cristiane de Souza Campos e Wilian Pereira dos Santos faz parte dos quase 2 mil brasileiros obrigados a retornar ao país somente este ano.
Wilian conta que passou 61 dias preso antes de passar pela deportação. Nesse tempo, perdeu o nascimento do filho. No presídio, sofreu com alimentação de má qualidade e privação de água, limitada a duas garrafinhas por dia. Além disso, ainda passou pela obrigação de arcar com parte dos custos de sua detenção. “Gastei mais de 500 dólares somente em ligações para a família”, relatou.
Já Josefa Bezerra da Silva, também presente na reunião, teve o filho preso em janeiro em um centro de detenção norte-americano, onde ele permaneceu por quase seis meses. Após a transferência dele para outro local pelo órgão de controle de imigração dos Estados Unidos (ICE – U.S. Immigration and Customs Enforcement), Josefa ficou mais de três meses sem receber qualquer notícia. Agora, seu filho está prestes a passar por deportação para o Brasil.
“Nós estamos sendo caçados como cachorros com raiva. Estamos sendo sequestrados nas ruas por homens armados”, denunciou Heloísa Maria Galvão, cofundadora do Grupo Mulher Brasileira. O grupo, formado apenas por mulheres, presta suporte a imigrantes brasileiros em situação irregular, com o pagamento de fianças, fornecimento de comida e apoio em questões burocráticas.
Desaparecimento
Heloísa contou que soube de um brasileiro cujo filho foi assassinado em julho. Como as investigações ainda estão em andamento, as autoridades orientaram ele e a esposa a não deixar os Estados Unidos, apesar de estarem em situação irregular. Desde então, esse brasileiro desapareceu.
Heloísa relatou outra situação em que agentes do ICE prenderam um brasileiro na frente do filho ainda criança e abandonaram o menino sozinho no banco de trás do carro após a operação. “A situação está insustentável. As pessoas não vão ao supermercado, não vão ao médico, não levam os filhos na escola, por medo”, diz a ativista.
Por falta de espaço, conta Heloísa, muitas pessoas estão sendo presas nos escritórios do órgão de imigração e dormindo no chão em esquema de revezamento. Não podem escovar os dentes, tomar banho, trocar de roupa ou fazer uso de medicações prescritas e controladas, tomadas à força pelos agentes norte-americanos.
Mineiros são maioria entre deportados
“Os dados e os fatos que nos chegam dos Estados Unidos não são somente estatísticas, são sonhos sendo destruídos e separação de famílias”, afirmou o deputado Betão.
Bruno Pereira Albuquerque de Abreu, chefe da Divisão de Comunidades Brasileiras e Assistência Consular do Ministério das Relações Exteriores, afirmou que, apesar de o governo federal não poder interferir na legislação estadunidense, o Itamaraty tem agido para reduzir o tempo de detenção dos brasileiros em solo americano.
Ele afirmou que, depois do início do governo de Donald Trump, a retórica norte-americana anti-imigração se intensificou, mas que o número de brasileiros deportados não aumentou tão drasticamente como se imagina.Bruno de Abreu afirmou que as deportações aumentaram 19% em relação ao mesmo período do ano passado, e mais de 60% delas partiram de Minas Gerais.
O assessor do Itamaraty informou também que, a partir de 2010, houve uma intensificação do número de brasileiros passando pela fronteira do México com os Estados Unidos. Em 2021, esse número chegou a 100 mil pessoas. Muitos desses migrantes fizeram a travessia com apoio de contrabandistas, crime previsto na lei brasileira.
Hoje, pouco mais de 400 brasileiros estão detidos em situação imigratória irregular, segundo Bruno. “Nós não desejamos nem queremos isso para ninguém. Se eu pudesse fazer um alerta a quem ainda não foi, seria ‘não vá’. Imigrem de forma regular e segura. Caso não consigam regularizar, retornem ao Brasil”, aconselhou.
(Fonte: ALMG)