Formar novos leitores apostando em criatividade, talento e experiências sociais, utilizando inovação tecnológica dentro da biblioteca. Essa é a proposta do Biblioarte Lab, que tem transformado a biblioteca Centenário, em Poços de Caldas, em um grande laboratório comunitário para a formação de leitores do século XXI. A iniciativa, que agora é finalista do Prêmio Jabuti, começou em 2016 e de lá pra cá já alcançou cerca de 950 adolescentes entre 11 e 17 anos.
A ação nasceu da vontade de auxiliar bibliotecas públicas, comunitárias e escolares a desenvolverem sua vocação para a inovação, dando um novo significado para esse ambiente. Foi criado pela Ong Casa da Árvore, associação que atua desde 2007 em parceria e cooperação com movimentos sociais, redes públicas de ensino e instituições públicas e privadas. O objetivo da Ong é construir e exercer a cidadania a partir da cultura digital, encurtando as diferenças, permitindo novas formas de leitura do mundo e inspirando transformações sociais.
Para Aluísio Cavalcante, um dos sócios fundadores da Ong Casa da Árvore e coordenador do Biblioarte Lab, a proposta é, junto à comunidade, construir e reconstruir a biblioteca e seus espaços de leitura como um lugar para promover inovação social, ou seja, onde a comunidade possa construir ferramentas para se desenvolver de uma maneira sustentável a partir de uma organização democrática da discussão de ideias, a partir da construção de respostas a problemas. “Nós estamos falando de comunidades de leitores, e quem mais pode decidir ou pode falar como deve ser a biblioteca, trazer ideias para as bibliotecas, do que a comunidade que a integra, com as suas experiências de leitura? O Biblioarte Lab nasce desse desafio, o de pensar em como a gente pode auxiliar essas bibliotecas, a constituírem uma comunidade de inovação a partir da sua atuação, da sua programação, da sua política e de seu acervo”, comenta.
Como atua
O laboratório comunitário do Biblioarte Lab funciona na Biblioteca Centenário, que fica no espaço da Urca. Ali, são desenvolvidas as oficinas e laboratórios criativos que buscam ampliar a capacidade de expressão e de participação social dos jovens e adolescentes.
No laboratório, arte, tecnologia e informação são o ponto de partida para todos os estudos desenvolvidos ali. Os projetos experimentais e as oficinas são construídos junto a jovens leitores, estudantes de engenharia, alunos de teatro, de publicidade, e jovens leitores que atuam em outras áreas e que possam, de alguma forma, contribuir para o desenvolvimento, atuando como mentores.
“A gente atrai essas pessoas que geralmente não estão relacionadas à formação de leitores para construir essa programação. Nós desenvolvemos um programa de formação em exercício para que jovens talentos, que gostam de leitura, mas que atuam em outras áreas de conhecimento, possam trabalhar em parceria. Inovação é isso, é você criar respostas a partir de vozes distintas e experiências distintas”, destaca Aluísio.
As oficinas e laboratórios criativos abrangem diferentes tipos de produções culturais, sempre ligadas à literatura, de forma a ampliar a interação dos jovens e adolescentes com esse universo. Dentre os projetos experimentais e laboratórios criativos desenvolvidos no projeto, destacam-se a revista digital Página 9 ¾, que visa aproximar a literatura do dia a dia dos jovens na internet de forma criativa e crítica; Robótica Poética, um laboratório dedicado à criação e desenvolvimento de brinquedos interativos, inspirados na literatura infantil e nas tradições brasileiras, e o Booktuber, laboratório para jovens interessados em explorar plataformas digitais de vídeo por meio de expressão cultural e compartilhamento de experiências de leitura.
Cada ação tem em média a duração de quatro semanas, com três encontros semanais de duas horas cada, no contra-turno escolar. Além dos laboratórios realizados na Biblioteca Centenário, também são realizadas pequenas oficinas em bibliotecas escolares, até mesmo para despertar o interesse dos alunos para o trabalho.
“A gente trabalha para a criação de uma comunidade, então o laboratório passa a ser um ponto de encontro da galera que gosta de ler e está querendo compartilhar suas experiências de leitura, porque hoje a função social da leitura é o que dita nosso comportamento de leitor. A nossa relação com a leitura hoje está muito mais relacionada à função social de ler e escrever para participar e para construir uma identidade e, quando a gente traz essa provocação, a gente atrai leitores que têm esse perfil e que passam a ter um poder de influência muito grande na sua própria rede, na sua própria comunidade. Eles começam a fazer mais menções das suas experiências de leitura, seja na internet, em casa, na escola. Esses são os desdobramentos do Biblioarte Lab, a gente tem o objetivo de trabalhar essa rede de jovens influenciadores”, conta Aluísio.
Aprendizado
Gabriel Henrique Simão tem 18 anos e participou do Biblioart Lab. Aluno de escola pública, chegou ao projeto com 16 anos, ficou por mais de um ano e conta que ali fez muitas descobertas, amizades, e aprendeu a roteirizar e editar vídeos. Ele, que não tinha nenhuma experiência com tal tecnologia, acabou descobrindo sua vocação e pensa em se profissionalizar na área. Mas, o mais importante, foram outros desejos que o projeto despertou. “Além de obviamente a leitura, teve a própria interação com os outros, o compartilhamento de idéias, achar algo que todos gostaram de produzir. O que eu levo hoje do projeto é mais esse lado social, um jeito melhor de me expressar e ser compreendido”, diz.
Nicolle de Oliveira Campos, de 15 anos, participou durante dois anos do Biblioart Lab, nas oficinas de Booktuber e edição de vídeos. Segundo a estudante, o projeto a ajudou a melhorar a forma de se comunicar com as outras pessoas e até mesmo de encarar certas obras literárias. “Como eu apenas estudo, quando é preciso eu edito os trabalhos e, se for preciso apresentar, eu apresento com maior facilidade. Mesmo por trás das câmeras, é muito difícil falar para o público, então quando eu pratiquei consegui melhorar muito minha fala e isso me ajuda muito no dia a dia”, conta.
Prêmio Jabuti
O Biblioarte Lab é um dos finalistas da nova categoria Inovação em Formação de Leitores, da 60ª edição do Prêmio Jabuti, um dos mais importantes prêmios de reconhecimento literário do Brasil. A edição comemorativa do prêmio passou por uma racionalização de suas categorias, com o objetivo de se aproximar do leitor e se atualizar frente ao mercado.
Para o coordenador do Biblioart Lab, ser um dos finalistas na categoria é não só um reconhecimento pelo trabalho que vem sendo realizado, mas também uma forma despertar outros agentes de transformação. “Esses reconhecimentos são legais para ampliar a voz da reflexão que a gente está trazendo, então a gente fica muito feliz. Quando se volta os olhos para as ações com dimensão social da leitura, para formação de leitores, da inovação em formação de leitores, a gente atrai olhos de outros atores que também podem ser agentes dessa transformação”, conclui.
A cerimônia de anúncio dos vencedores do Prêmio Jabuti 2018 acontece no próximo dia 8 de novembro, em São Paulo, e reúne os principais nomes, empresas e organizações do mercado editorial.
Saiba mais sobre o Biblioarte lab na página do projeto no Facebook.