Primeiramente, encare isto: todos somos vendedores, portanto, vendemos o tempo todo. Do contrário, sua obra continuará sem encontrar seu público.
Agora posso começar o texto trazendo a percepção do tabu que o setor da cultura tem com a palavra “vender”. O termo muitas vezes evoca a figura do artista que trocou a produção autoral, de nicho, única, provida de aura (citando Walter Benjamin), pela mercadológica, massificada, reprodutível e desconectada da cultura popular (para lembrar de Theodor Adorno). O melhor exemplo aqui é o artista visual Romero Brito.
Este “vendido”, que estampa rótulos de bebidas, chinelos e salões de arte, certamente não se identifica com a dificuldade que todo artista tem em vender seu trabalho. Tal reconhecimento profissional e financeiro reverbera-se pelos mercados da arte e seus segmentos, e que diversas vezes não poupa críticas ao mesmo. Independentemente de ser ou não recalque, é fato que Romero Brito encontrou seu público e aprendeu a se comunicar assertivamente com ele.
Contudo, acredito que quando qualquer artista submete um projeto para alguma lei de incentivo, na qual precisa deixar claro os 5W2H – 5 W: What (o que será feito?), Why (por que será feito?), Where (onde será feito?), When (quando?), Who (por quem será feito?); 2H: How (como será feito?), How much (quanto vai custar?) – ele está planejando o lançamento de um produto, que se não tiver sustentabilidade comprovada, dificilmente será aprovado e terá sucesso.
Em outras palavras, toda essa cadeia de ações amplamente conhecida pelos gestores da cultura são requisitos fundamentais para se vender o projeto, produto ou serviço em várias escalas, da ideia à execução, passando pela figura de um financiador – que certamente quer saber o que ganha em troca. Aliás, “troca” é a palavra chave que media todo o processo, uma vez que se insere na esfera comercial. Está ficando claro a necessidade e a importância de compreender mais sobre vendas?
Se não, aí vai um exemplo: recentemente acompanhei à distância um grupo de teatro que decidiu se apresentar em uma cidade vizinha. Todo o trabalho relativo ao ofício da atuação estava pronto, se considerarmos a produção, os ensaios, o texto, as marcações, a iluminação, mas qualquer um sabe que ser artista no Brasil não se restringe apenas a isso. Lotar um teatro dá trabalho, e o desafio de, ao menos, cobrir os custos martelava na cabeça dos membros da cia.
Não adianta, a melhor solução para este problema é investir pesado na divulgação para, assim, vender mais ingressos e aumentar a arrecadação. Então, é muito importante que estes profissionais, e tantos outros do setor cultural, rompam o pensamento maniqueísta sobre vendas, ligado ao capitalismo muitas vezes não ético. É preciso a compreensão de que o espetáculo é um empreendimento que leva benefícios para seu público. Além do mais, há de se convir que lazer, diversão e entretenimento são serviços também necessários à sociedade.
Logo, entender um produto cultural apenas em seus aspectos criativos é pensar um projeto pela metade. Por um julgamento errado, a classe artística se concentrou apenas num aspecto da produção cultural, negligenciando a venda do mesmo e, com isso, inviabilizando o consumo de arte – autoral ou não – em maior escala. Afinal, se a obra tem qualidade, por que a negar sua promoção?
Em suma, a proposta envolve reflexão em prol de uma desconstrução. Se os artistas não enxergarem os benefícios que suas mercadorias oferecem ao mercado, jamais haverá clientes convencidos e dispostos a pagar o valor do qual todos precisam para viver nesse sistema de produção. Logo, o resultado continuará sendo teatros vazios, ateliês abarrotados de quadros, projetos culturais na gaveta e, o pior, profissionais frustrados.
*Guilherme Garcia (gui.com.soc@gmail.com) quer promover o mercado de artes e cultura em Poços de Caldas e região.