“Como é seu processo criativo?”. Essa é a pergunta feita por 10 entre 10 curiosos quando se encontram frente a algum artista. Eu mesmo fiz essa pergunta à cartunista Laerte, numa rara oportunidade de jantar a seu lado. Também ouvi fazendo essa pergunta ao ator Heinz Limaverde, da Cia Rústica, num workshop realizado o ano passado na Urca.
Fico pensando quantas vezes os criativos são indagados por esses sujeitos que, como eu, talvez por nervosismo, talvez por falta de assunto, questionam sobre o método utilizado para extrair assunto de uma folha em branco. A verdade é que criar é algo penoso, e vem de um processo subjetivo, mesmo quando se tenta estipular fórmulas (até mesmo funcionais) para o mesmo.
Talvez você não tenha percebido caro leitor, mas falhei com você na semana passada. Sabe como são os feriados, eles fazem isso com a gente. Se não fosse a festa do Carnaval, seria a indisposição da ressaca, o mal-estar devido ao calor ou algum problema de saúde ou questão familiar, talvez.
Posso até alegar preguiça, mas nunca – leia bem – nunca, questione a minha criatividade. Nada mais irritante para um criativo do que ter sua habilidade, a capacidade de encantar com novas criações, posta à prova. Mas não quero te enganar, a verdade é que passo por um terrível bloqueio criativo.
Nada pior, admitamos, do que encarar uma página em branco em cujo lugar deveria haver um texto brilhante, um desenho que salta aos olhos, um roteiro que cativa. No lugar disso, o vazio, e a sensação de que nunca mais conseguiremos produzir novamente.
Dizem que a criatividade é a capacidade de rearranjar repertórios adquiridos outrora. Foi assim que Steve Jobs recriou o telefone celular combinando-o com a tela sensível ao toque e suas características multifuncionalidades. Contudo, não ache que esse é o único ingrediente cabível nessa receita.
Também é importante ser vanguarda, propondo algo que ninguém tenha feito antes, fazendo do seu produto ou serviço uma referência naquilo que oferece. José Celso Martinez Correa lançou mão da combinação do teatro em sua concepção grega, voltado para a arena, mas com um olhar tropicalista pautado na antropofagia cultural de Oswald de Andrade. Profanação e brasilidade deram o toque único das produções teatrais do Teatro Oficna Uzyna Uzona.
Mas recombinação e vanguarda, apenas, não surgem como fórmulas prévias para escapar do bloqueio criativo: é preciso esforço e uma clara decisão do que se quer. Em resumo, é estudo e conhecimento prévio somado a uma meta estabelecida. A de Steve Jobs foi de entregar um dispositivo que aliasse usabilidade móvel com a gama de facilidades dos computadores da época. A do Zé Celso foi fazer teatro brasileiro fora do tradicionalismo burguês vigente. E Heinz, e Laerte?
Ou seja, quando pensamos em processo criativo, por mais que busquemos técnicas, esbarramos no que conduz cada um a fazer o que faz. Bloqueios criativos, nesse sentido, são naturais, pois mostram que ali tem alguém que está buscando fazer e refazer, da melhor forma e da maneira mais inovadora possível.
Entretanto, lidamos com prazos e combinados que não nos permitem que idealizemos para sempre o que queremos oferecer. No entanto isso é bom, pois trás para a realidade pessoas que vivem no mundo das ideias com suas invenções. Logo, para elas, fica a dica daquele velho ditado: “melhor feito do que perfeito”.
Em resumo, caro leitor, este é o texto dessa semana. Foi o melhor que deu para fazer, com o prazo e o conhecimento que eu tinha. É o mínimo viável para a publicação, que se não sana minha crise de criação, ao menos resolve a questão do vácuo que a ausência deste poderia causar nesta publicação.
*Guilherme Garcia (gui.com.soc@gmail.com) é cientista social, produtor cultural, facilitador de processos e entende o futebol como cultura e o teatro como gestão de equipe. E vice versa.