Carnaval em Poços de Caldas também tem hip hop. O grupo Leve se apresentou no Grito Rock, na segunda-feira (8), com rimas de cunho social e batidas ao som de Tim Maia e Johnny Rivers, entre outras referências.
A partir de hoje, o Poços Já Divirta-se publica uma série de entrevistas com bandas que participam do festival.
Poços Já: O que o Grito Rock representa para vocês?
Dough: O hip hop hoje está crescendo muito, a música rap está ganhando muitos espaços que não conseguia atingir. O próprio Grito Rock Festival é um exemplo disso, de que a cultura da música suburbana está conseguindo se expandir. Hoje a gente consegue dialogar muito bem dentro do festival, que também apresent aum suporte muito legal para a gente. Estamos conseguindo ganhar cada vez mais espaço nesse meio da música independente.
Robson: É muito importante porque, além de mostrar o nosso trabalho, mostra o trabalho de vários artistas que realmente levam a música a sério, encaram a música como profissão. O Grito Rock mostra a cara de muitos artistas.
Dough: O público que a gente tinha no ano passado, além de continuar, expandiu muito. A gente consegue atingir públicos de outras bandas, como por exemplo das Bahias, e ter um contato legal com essa galera.
Poços Já: Gostaria que vocês falassem sobre o conceito do grupo, as influências.
Dough: A gente busca bastante influência dentro do próprio rap e fora dele também. Eu sou beatmaker, sou produtor, faço as próprias batidas do grupo junto com outros parceiros também. Eu costumo ouvir muita bossa nova, que a gente mistura, essa música funkeada, swingada, jazz, soul.
Poços Já: O hip hop é originário do movimento negro, do gueto, mas hoje atinge mais pessoas?
Dj Mancha: O hip hop surgiu como música de manifesto do gueto, mas com o passar dos anos deixou de ser só música de manifesto. O rap é o jornal da periferia, o diário, de acordo com a vivência de cada MC. Automaticamente, a evolução do mundo e o acompanhamento do hip hop na evolução musical fizeram com que ele fosse aceito por outras camadas sociais. A televisão está consumindo, a rádio está consumindo mais, mas ainda é pouco. Temos que ter uma emissora de rádio nossa, um canal de TV que fale a nossa linguagem, em uma grande mídia.
Dough: A gente até discutiu isso, dois dias atrás, a questão de ter nascido como um movimento negro e o envolvimento de pessoas que não originaram nesse movimento. Hoje no Brasil a gente não consegue definir quem é 100% caucasiano, 100% negro. Acredito que a cultura hip hop também foi se misturando, pegando coisas de vários lados, e outras pessoas começaram a entender esse processo, esse movimento, a ver o que a comunidade negra vivia ao criar isso e como ela está se desenvolvendo no decorrer do tempo. Muita gente que talvez não estava em direto contato com a periferia começou a entender o que estava acontecendo e a se mobilizar. Não só como movimento negro, o hip hop é mundial, uma nação.
Poços Já: Vocês estão tocando em um evento de Carnaval, mas alternativo. Quais as suas opiniões sobre o Carnaval e como se posicionam como artistas nesse período?
Dj Mancha: Eu não gosto, porque no Carnaval a minoria ganha dinheiro e a grande massa gasta dinheiro. Dizem que acrescenta em cultura, na questão financeira, mas se perde muito mais do que se ganha. Se perde em acidentes, em jovens se envolvendo com drogas, brigas, assassinatos. É muito mais viável investir em educação do que um milhão em escola de samba como no Rio de Janeiro. Os hospitais sucateados, os postos de saúde não estão atendendo mais, mas tem o dinheiro da escola de samba. Mas o Grito Rock é um evento totalmente diferente do Carnaval imposto aí fora.
Dough: A gente tem um cunho social, alguns questionamentos, e o grito Rock é também uma oportunidade de mostrar essa realidade. A gente gosta da festa, de estar envolvido, de ter contato com as pessoas, mas também é uma oportunidade de mostrar o trabalho.
Robson: Eu acho importante incentivar esses paralelos. Às vezes tem pessoas que não gostam do Carnaval de rua, de escola de samba. A proposta do Grito Rock casa bem com essas pessoas e a procura aumenta. Eu vejo como necessário, para um artista independente, um rolê desse. Tem muita gente fazendo o mal todo dia, eu não posso ter o descanso de ficar em casa só porque é Carnaval enquanto posso mostrar o meu trabalho e talvez mudar a vida de uma pessoa.
Poços Já: O hip hop está crescendo?
Dough: Eu vejo que está crescendo bastante. No Brasil a gente sempre teve referência nos Estados Unidos, onde foi criado, mas está crescendo. São Paulo tem uma cena muito forte. A música está conseguindo vender, o artista hoje em determinadas condições, trabalhando de uma forma legal, consegue tirar o sustento dele. Profissionalmente o hip hop está crescendo bastante, mas tem que tomar cuidado para não virar uma coisa banal.
Dj Mancha: Estão começando a entender que são profissionais da música. Tem ainda uma resistência, o cara critica o outro que vai na TV, mas esquece que ele é músico. Se ele não vender o produto dele vai vender o quê? Falta ainda uma grande maioria abrir a cabeça nesse sentido. Somos produtos, precisamos vender, somos músicos, vivemos de música. Na década de 90 estávamos engatinhando, no início do ano 2000 começamos a dar os primeiros passos a agora acabamos de pegar o equilíbrio. Daqui a uns quinze, dez anos, vamos estar andando direitinho.