
Plásticos já fazem parte do cotidiano, embalagens, roupas, tintas. Mas quando se quebram em fragmentos microscópicos, chamados microplásticos, eles deixam o lixo visível e entram num território invisível e perigoso: solos agrícolas, rios e oceanos. Uma pesquisa liderada pela Universidade de Nanjing, em parceria com a Universidade de Massachusetts Amherst e centros europeus, mostrou que essas partículas minúsculas podem inibir a fotossíntese de plantas e algas em até 12%.
Para um planeta que já enfrenta mudanças climáticas e conflitos que pressionam a produção agrícola, esse resultado soa como alarme. Se a fotossíntese, base de toda a cadeia alimentar, perde eficiência, menos arroz, trigo, milho e peixes chegam à nossa mesa. Entender o problema é o primeiro passo para agir, e é exatamente isso que este texto se propõe: explicar de forma simples como microplásticos afetam a comida no prato e que saídas estão ao nosso alcance.
Da garrafa ao grão: o caminho invisível dos microplásticos
A jornada dos microplásticos começa em objetos cotidianos. Garrafas, sacolas ou tecidos sintéticos se desgastam, liberando partículas menores que um grão de açúcar. Essas partículas são levadas pelo vento ou pela água e acabam depositadas no solo onde plantamos e nos mares onde pescamos. Quando entram em contato com as raízes ou folhas de vegetais, aderem às superfícies e bloqueiam parte da luz ou alteram processos químicos ligados à produção de clorofila, o pigmento verde responsável por captar energia solar.
O resultado é uma planta que cresce menos e produz menos grãos. No oceano, o efeito é semelhante: o fitoplâncton, responsável por quase metade do oxigênio que respiramos, também sente a presença dos microplásticos. Menos plâncton significa menos peixes e mariscos nos níveis seguintes da cadeia alimentar. A produção global de comida, portanto, sofre um baque silencioso, difícil de medir a olho nu, mas devastador quando somado em escala planetária.
Números que não cabem no prato
Os cientistas recorreram a modelos de computador para transformar essa perda invisível em estatísticas concretas. Foi aí que surgiram projeções impressionantes: até 360 milhões de toneladas (t) de grãos podem deixar de ser colhidos a cada ano, junto com 24 milhões de toneladas de peixes e frutos do mar. Para entender o tamanho do estrago, pense que isso equivale ao consumo anual de proteína de mais de 100 milhões de pessoas.
- Milho: pode perder até 161 milhões t anuais
- Trigo: cerca de 111 milhões t
- Arroz: próximos de 87 milhões t
- Peixes e mariscos: até 24 milhões t
Boa parte dessas perdas ocorre na Ásia, Europa e América do Norte, onde a produção agrícola e o descarte de plástico são elevados. No entanto, as consequências atingem economias menos desenvolvidas que importam comida ou dependem da pesca artesanal. O que parece um problema distante, portanto, volta em forma de preços mais altos e escassez nas prateleiras do mercado.
E o Brasil nisso tudo?
O Brasil é potência agrícola e grande consumidor de plástico. Estudos recentes já detectaram microplásticos em solos do Cerrado, na água de rios amazônicos e até em peixes vendidos em feiras.
A boa notícia é que pequena redução na carga de microplásticos traz retorno rápido. Os autores calculam que cortar apenas 13% das partículas no ambiente pouparia mais de 100 milhões t de alimentos anuais.
Para chegar lá, o Brasil pode ampliar a coleta seletiva, incentivar embalagens reutilizáveis, investir em pesquisa de bioplásticos e adotar filtros em estações de esgoto que capturam fibras sintéticas. Cada iniciativa conta, porque, no fim das contas, proteger a fotossíntese é proteger a vida, e o nosso prato de cada dia.
(Fonte: Tempo.com – referência da notícia: A global estimate of multiecosystem photosynthesis losses under microplastic pollution)