Como definir a tão almejada nova política, muito citada na hora de pedir votos? Possíveis vereadores e prefeitos bradam ser independentes e arrojados, modernos e preparados. Mas no fim das contas, o que quer dizer isso?
Esse discurso, muitas vezes vazio, fica para trás quando se fala de nova política com propriedade. O administrador de empresas e empreendedor social Gustavo Bonafé foi o quinto candidato mais votado em 2016, eleito vereador com 1.823 votos. A expectativa é que a chamada “nova política” tenha encontrado nele um verdadeiro representante, que preza pela transparência, educação política e empreendedorismo social. Mas agora ele tem um grande desafio pela frente: mostrar que é possível colocar em prática rumos diferentes dos praticados há décadas não só pelos políticos, mas por seus próprios partidos.
Poços Já: Como você começou a se interessar pela política?
Gustavo: Antes de me interessar pela política eu sempre tive um envolvimento com o social. Desde pequeno, a minha formação na escola e o meu relacionamento com o esporte já foram me trazendo algumas competências, algumas habilidades para lidar com o social. Eu entendo que o social é você saber lidar com as pessoas de diferentes classes, de diferentes etnias, diferentes crenças e culturas. E aproveitar aquele universo de diversidade para promover o bem. Desde a minha adolescência eu tive um vínculo muito forte com o social.
Poços Já: De onde vem esse vínculo?
Gustavo: Vem tanto de iniciativas minhas, com o meu irmão, meus amigos, de criar eventos beneficentes, por exemplo, em um momento em que estava germinando essa questão, até depois me envolver profundamente com trabalho voluntário em ONGs, tanto em Poços como fora de Poços principalmente. Eu tive a experiência através da AIESEC no Brasil, que é a maior organização estudantil do mundo. Eu tive a oportunidade de começar na AIESEC em Campinas (SP) e de depois ser diretor financeiro da AIESEC no Brasil. Nessa oportunidade eu era um voluntário responsável pelo desenvolvimento de três mil jovens espalhados pelo país. Depois eu fui florescendo ainda mais e tive a oportunidade, com empreendedorismo social e voluntariado, fora do país. Eu prestei serviços sociais na Mongólia, na China, na Indonésia, e tive contato com uma realidade completamente diferente. Tive contato com questões gravíssimas de desenvolvimento da humanidade. Eu não me esqueço de uma cena de algo que a gente sempre ouve falar, que é a fome. Na Mongólia eu vi um cara quebrando uma cabeça de gado tentando pegar a carne que estava ali dentro. Eu entendi o que é a fome.
Poços Já: O que você fazia lá?
Gustavo: Eu era professor de inglês, dava aula para crianças de cinco a nove anos. Foi uma experiência muito bacana porque ela me aproximou da educação, de ser professor, de ter que preparar aula, e ter o desafio de ensinar uma língua que não é a minha língua mãe e não era a língua mãe das crianças da Mongólia. Eu não falava mongol, eles não falavam português e a gente tinha que encontrar um meio do caminho através do inglês. Aquilo que me deu a chama da educação, do desenvolvimento humano, e norteou a minha carreira.
Poços Já: Você foi um dos candidatos a vereador que fez uma campanha digital muito forte. As redes sociais também vão estar presentes no seu mandato?
Gustavo: A tecnologia vai passar como ferramenta de apoio para a minha gestão. O mandato é muito mais presencial do que digital, mas o digital vai fazer toda a diferença. As transmissões ao vivo vão continuar acontecendo, mas agora com o intuito de mapear os problemas da cidade, mapear questões, me aproximar, tirar dúvidas da população. Facebook e site vão continuar sendo meus canais de prestação de contas, uma prestação de contas constante, no mínimo mensal. Eu vou deixar aberto todo meu salário, quanto que eu ganho, quanto que eu invisto em educação política, em projetos, e quanto eu realmente tiro líquido, quanto que tem de impostos, quanto que vai para o partido. Deixar clara também a declaração de bens, que é algo que tem que ser anualmente comprovado para a Câmara, mas eu quero deixar isso claro também para a população. Então eu vou deixar o meio digital como mecanismo de informar e educar a população, que são duas funções negligenciadas pela maioria dos cargos legislativos. Acontece muito o fiscalizar e o legislar, e isso realmente é o mais importante, porém é papel do legislador informar e educar. A gente chegou em um momento da política que não é a população que tem que ir atrás do vereador e acompanhar o trabalho, é o vereador que tem que mostrar para a população o que ele está fazendo durante quatro anos.
Poços Já: A sua campanha foi mais voltada para as redes sociais, ou você também foi para a rua pedir voto?
Gustavo: Eu acho que foi um grande diferencial, ganhei muitos votos através da internet. Isso é fato. Eu acho que foram decisivas as visitas em empresas e organizações durante a campanha. Quando começou a campanha, todas as minhas redes sociais já estavam programadas. Todo dia tinha um conteúdo, e um conteúdo diferenciado. Não era só minha foto, meu número, “vote em mim”. Era um pouco da minha história, uma proposta, uma dica de educação política, um vídeo falando sobre o papel do vereador, por exemplo. Enquanto estavam rolando as coisas nas redes sociais eu fui para a rua. Visitei mais de cem organizações. À noite eu ia para a internet, duas vezes por semana, para fazer as transmissões ao vivo, que também deram bastante repercussão. Foram uma maneira de interagir com o eleitor, tirar todas as dúvidas, e mostrar realmente o quanto eu tinha me preparado para isso. Nessas visitas eu sempre fazia questão de me apresentar, eu nunca fui em uma organização em que eu só pudesse entregar o meu santinho.
Poços Já: A maior parte do seu eleitorado é jovem?
Gustavo: É, eu acho que tem um eleitorado bem jovem, que é o público que está muito conectado na internet. Mas foi muito legal, um perfil diversificado e espalhado por toda a cidade. Eu fiz um levantamento, 92% das urnas em Poços tinham pelo menos um voto meu. Foi legal que chegou em todos os lugares, eu fiquei bem feliz. Muita gente comenta que eu fiquei focado em um ninho só, em uma zona só. Mas se você for ver a zona 222 e a 365, está bem equilibrado de votação. Mas eu acho que o público jovem deu uma força bacana. E gostaria de ver mais, porque a gente teve um nível de abstenção muito grande.
Poços Já: Você acha que essa grande abstenção pode ter contribuído para a sua eleição?
Gustavo: Pela votação expressiva que eu tive, talvez a abstenção não tenha sido decisiva. A gente teve renovação sim, 11 nomes foram renovados. Dois retornos, nove novos, iniciantes na vida política. Porém, acho que esse número traz mais uma responsabilidade dessa nova formação da Câmara em buscar um resgate da aproximação da população com a política. Tivemos uma renovação de nomes, mas a grande renovação, que é de esperança, de consciência política, ainda está por vir.
Poços Já: Você já disse algumas coisas, mas exatamente como é a nova política que você propõe?
Gustavo: O primeiro ponto da nova política é que o novo político entende que tem além de quatro anos de trabalho. O meu mandato começou há quatro anos, quando eu tomei a decisão (de se candidatar), e vim me preparando, fazendo diversas formações políticas, complementando a minha formação em administração de empresas. O segundo ponto é que o novo político usa as redes sociais para gerar uma inteligência coletiva. Eu acho que também é uma ferramenta que deve ser utilizada cada vez mais de uma maneira consciente. O novo político tem que se portar como um líder pelo exemplo. Esse é outro ponto. Ele cria iniciativas para a construção de diálogos, então ele não fica preso ao gabinete nem limitado a visitas pontuais nos bairros. Ele cria espaços realmente produtivos para soluções públicas emergirem junto com a população. O novo político não tem medo de ser transparente e cria mecanismos para tornar essa transparência mais ativa. O novo político educa a população, ele não fica receoso de, se educar, perder o lugar. Está em constante transformação, ele não se cansa de aprender nem de compartilhar esse aprendizado com a população. A partir do momento que ele tem a informação nas mãos, cabe a ele informar o cidadão, informar a cidadã, para aproximar essas pessoas do trabalho do político. A partir do momento que você aumenta o número de pessoas pensando a cidade, você aumenta a complexidade mas também a qualidade das decisões. Ele não tem medo de trabalhar com o complexo, ele gosta.
Poços Já: Você propõe a nova política, mas vai fazer parte de uma Câmara em que talvez o pensamento não seja esse. E no seu partido também. Há uma intenção de criar um movimento para que toda essa consciência mude?
Gustavo: Eu acredito que uma população mais consciente traz um político com mais qualidade para representá-la. A educação política vai ser um dos meus pilares. E provocar o velho político trazendo novas práticas. Acredito que, quando eu deixo aberto o meu salário e trago transparência nele, eu estou provocando um sistema que já está acostumado a trabalhar na cultura do sigilo e não na cultura da transparência. A gente tem que fazer essa transição aos poucos.
Poços Já: E assim eles vão ser cobrados também.
Gustavo: A partir do momento que você tem um puxando, pode ser cobrado. Se bem que agora está mais aberto, você sabe o quanto o vereador ganha. Mas é importante a população saber que tem imposto de renda em cima, tem alguns benefícios e outros não.
Poços Já: Como você avalia essa última legislatura?
Gustavo: Acho que foi uma Câmara subjugada ao Poder Executivo. A gente não viu a independência dos poderes nesses quatro anos, a gente viu uma dependência dos poderes e isso não é o correto. Não podemos generalizar, mas eu vi que foi uma Câmara apagada, que dependia do Executivo para as coisas acontecerem. A oposição ficava de mãos atadas, mas ao mesmo tempo sempre teve uma postura muito de embate. Não foi uma oposição tranquila, poderia ter sido melhor, mais dialogada desde o início. Teve um peso de rixas partidárias muito grandes, que atrapalhou um pouco a evolução dos trabalhos. Ao mesmo tempo, eu vejo que foram feitas muitas audiências públicas. Eu vejo isso como um benefício, mas a comunicação e o convite para a população poderiam ser mais elaborados, para a participação popular ser maior. Mas foi uma abertura bacana, que deve ser mantida. O vereador é um servidor da população. Ele é um representante, mas ele está abaixo da população. E por que não a gente pensar também em mudanças no horário da sessão? Embora a gente tenha uma carga maior de hora extra, é uma Câmara enxuta. Isso é fato. É uma Câmara que poderia gastar mais de 30 milhões e gasta por volta de seis, dez. Isso facilita a tomada de decisão de reaproximar a população a partir da articulação do horário das sessões. Eu vejo que foi uma Câmara que fez o básico, que agora na reta final começa a validar algumas questões importantes, como o Código de Posturas. Mas eu vi poucos projetos de lei e muitos pedidos de informações, que ficavam travados também. Se eu peço informação, o que eu faço depois com essa informação? Eu acho que é natural a gente trabalhar com mais consciência junto ao Poder Executivo, até porque tem uma tendência desses dois andarem juntos, mas separados, se é que posso dizer isso. O Legislativo é um poder independente e tem que se dar a devida importância no desenvolvimento da cidade.
Poços Já: Como vai ser o seu posicionamento enquanto situação?
Gustavo: É uma postura de escuta aberta, mas eu nunca vou tomar minhas decisões por questões partidárias. Isso eu já deixei bem claro desde o início da campanha. Acho que facilita o diálogo entre Legislativo e Executivo, vai ser mais fácil chegar ao prefeito, o que já é tranquilo. Eu tenho um diálogo muito bom com o Sérgio, mas em momento algum eu posso confundir essa abertura, essa facilidade, com a responsabilidade que eu tenho com a população. Eu fui eleito pela população, não pelo partido. Eu não posso me prender e nem me deixar levar por decisões em massa. Eu tenho que ter o discernimento de pensar decisão por decisão antes da minha postura final.
Poços Já: Quais vão ser os pilares do seu mandato?
Gustavo: O vereador tem que ser um clínico geral, tem que entender de tudo um pouco. Mas as áreas que eu quero atuar e fazer história são transparência pública, educação política e o empreendedorismo com foco na geração de empregos sustentáveis. E por trás, fechando tudo isso, a missão de Poços como referência em transparência e gestão participativa.