Não faz muito tempo que macarronada no domingo era um luxo só! Ou será que faz muito tempo e eu nem vi passar? Nunca vou saber se sim ou se não. É que o tempo de cada um é diferente. Cada dia, de cada pessoa, leva um tempo para passar. Os meses e anos, por conseguinte, idem.
Geralmente os primeiros anos de vida são arrastados, não passam. Os últimos também. E no meio estão os anos a jato. Voam a velocidades altíssimas, mal dando tempo de vermos o que passou. Pode ser que, por causa dos anos a jato, eu não tenha percebido o tempo passar.
Talvez por isso eu ache que não faz muito tempo que a macarronada de domingo era um luxo só. O importante é que era. Pelo menos para mim. Eu aguardava com muita ansiedade a chegada do domingo para me empanturrar de macarronada. E o que ela tinha de especial?
Primeiro: um espaguete com mais de meio metro de comprimento, com um detalhe, tinha um furinho no meio. Segundo: massa de tomate “elefante” com muita fartura. Terceiro: queijo minas, curado e ralado, por cima de tudo.
Tinha uma particularidade: todo domingo eu queria saber de minha mãe como é que faziam um furinho no meio daqueles macarrões. Ela me enrolava e dava uma explicação meio: “Hã, hã, quer dizer, hã, hã, eles pegam um arame e enfiam neles, hã, hã…”.
O problema é que ela tinha uma mercearia e vendia macarrão. E tinha uns que não tinham furinho no meio. Eu simplesmente inventei de fazer. Furei os pacotes com jeito, para não aparecer, e roubei alguns deles, de várias espessuras.
Cortei um pedaço do varal de arame, com alguma dificuldade, e tentei de todo jeito fazer um furinho no meio dos macarrões. O arame era mais grosso que muitos deles. É claro que não deu certo! Eles se quebravam facilmente, não suportando a pressão.
No domingo seguinte, na hora da macarronada com frango caipira, eu perguntei novamente para minha mãe como é que faziam o furinho no meio do dito cujo. E ela começou com a clássica resposta: “Hã, hã…”.
Ela não sabia das minhas experiências mal sucedidas. Por isso eu não mais aceitava aquela explicação. Retruquei com autoridade: “Não é desse jeito, não! Não dá certo!” Minha mãe logo sacou as minhas experiências: “Ah, então é por isso que os pacotes de macarrão estão todos furados, né?”.
Pois é, os anos passaram, eu fiquei velho e até hoje não sei como é que se faz o furinho no meio do macarrão. E qual seria sua função? Ele não estaria ali à toa… E como é que um furinho interfere no comportamento do macarrão? Facilita o cozimento? Ele fica mais macio? Ou seria para economizar matéria-prima? Será que nós compramos ar dentro do furinho e pagamos o preço da massa? Ou o furinho é tão pequeno que não entra ar? Se não tem ar, o que teria lá dentro?
Pelo que se vê, as dúvidas sobre o furinho do macarrão só aumentaram. Além de não ser esclarecida, essa dúvida ainda se fez acompanhar de muitas outras, pela vida afora. E isso só aumenta aquela impressão de que a macarronada de domingo, com todos esses mistérios “macarronísticos”, era sensacional.
Acho que até mesmo sem o macarrão, a macarronada seria especial. Somente o molho de massa de tomate com queijo ralado já seria ótimo. Pensando bem, só o queijo minas ralado já seria muito bom. Ou só o espaguete de meio metro com furinho no meio…
Quando paro pra pensar detidamente, não sei dizer se era tudo isso ou simplesmente a convivência familiar que tornava a macarronada de domingo tão saborosa… Talvez as reuniões de domingo na hora do almoço não precisassem nem mesmo da macarronada… Mas isso, a exemplo do mistério do furinho do macarrão, eu nunca vou saber…
*O autor é formado em Engenharia Florestal, com pós-graduação em Informática na Educação e Gestão Ambiental.